segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Breve análise da Política Nacional de Educação Especial: por Alex Garcia (pessoa surdocega)

Publicado na Revista REAÇÃO  (5/10/2020)

Gente do Bem! Espero vocês estejam com muita Saúde e Paz! O que vou escrever é muito importante, ler com atenção e paciência. Eu buscarei ser breve!

Em 30 de setembro de 2020 foi publicado no Diário Oficial da União o Decreto Nº 10.502 que Institui a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida.

Que fique muito claro, este texto, que agora escrevo, não tem por objetivo analisar o Decreto como um todo, mas, sim, tecer observações de pontos específicos que se conectam as Pessoas Surdocegas.

Iniciando o entendimento:

Eu, Alex Garcia, Pessoa Surdocega, com Hidrocefalia e Doença Rara, não nasci ontem. Tenho 44 anos de vivencias como Pessoa com Deficiência e ativista, e já 20 anos como Educador. Venho observando há uns 5 anos que muitas pessoas buscam incansavelmente pressionar as Pessoas Surdocegas a fazerem uso da LIBRAS. Resumidamente, muitas Pessoas Surdocegas fazem sim uso da LIBRAS, pois, esta é sua Língua Materna. Ótimo, assim devem seguir! Porém, existem outas tantas Pessoas Surdocegas que não fazem uso da LIBRAS, pois, sua Língua Materna está estruturada no Oral. Ótimo também! Ou seja, as Pessoas Surdocegas são plurais, em suas habilidades e necessidades. Nunca existiu, não existe e jamais existirá Pessoas Surdocegas “iguais”, muito menos em seus aspectos comunicativos.

Eu sei, vocês sabem, que no Brasil tudo pode acontecer! E, claro, iriam surgir pessoas de gigante $$ interesse $$ para pressionar e forçar Pessoas Surdocegas que não usam LIBRAS a “aprenderem” LIBRAS e assim passarem a “usar” com “fluência”. Logicamente, isso é complicadíssimo, assim sendo, milhares de Pessoas Surdocegas que possuem outros meios de comunicação (Com base oral) acabaram naufragando neste aprendizado, e, as pessoas interessadas nisso, por fim, excluíram estas Pessoas Surdocegas.
Acredito que a explicação acima está clara. Ao fazerem isso, as pessoas $$ interessadas $$ acabaram desenvolvendo uma espécie de “Gueto” no seio da Surdocegueira. O que era para ser cada um de seu modo e todos incluídos, acabou originando guerras entre as próprias Pessoas Surdocegas. As Pessoas Surdocegas que fazem uso da LIBRAS (Nem todas é claro) e que recebem muito “apoio” dos $$ interessados $$ acabaram por entender que eles são os “Verdadeiros Surdocegos” enquanto, obviamente, as pessoas Surdocegas que não fazem uso da LIBRAS são os “Falsos Surdocegos”.

Eu, Alex Garcia, sou uma Pessoa Surdocega, muito feliz, porque reconheço minha essência de “Quixote”, mas, não de “Idiota”. E acima de tudo, sou feliz porque tenho milhões de amigos no Mundo e outros milhões de inimigos (as) – estes, claro “amam” ler reflexões como esta que agora escrevo que poderíamos chamar de “Destapando o Pinico”!

Bem, dito isso, há alguns meses elaborei um texto com referências e publiquei no site da Agapasm. Vocês devem acessar o link e ler com muita atenção:

www.agapasm.com.br/multideficiente.asp

Chegando no Decreto:

O texto – do link – que acabaram de ler foi a ferramenta de luta, de alerta, para o que estava (E ainda acontece). Compartilhei o texto do link nas Redes Sociais, enviei por e-mail, enviei para Deputados, Senadores e muitas, mas muitas pessoas no Governo Federal. Foi a minha colaboração!

Surpreso e contente:

Ao ler o Decreto observei que pontos específicos veem ao encontro – para melhor – sobre a minha, a nossa busca por Liberdade, Igualdade, Livre Arbítrio e Escolha.

Art. 2º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:

II – educação bilíngue de surdos – modalidade de educação escolar que promove a especificidade linguística e cultural dos educandos surdos, deficientes auditivos e surdocegos que optam pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras, por meio de recursos e de serviços educacionais especializados, disponíveis em escolas bilíngues de surdos e em classes bilíngues de surdos nas escolas regulares inclusivas, a partir da adoção da Libras como primeira língua e como língua de instrução, comunicação, interação e ensino, e da língua portuguesa na modalidade escrita como segunda língua;

Atenção onde diz: …e surdocegos que optam pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras…
A palavra chave aqui é “Optam”. Para mim está claro que todos estão entendendo. O Decreto nos faculta o Direito de opção. Podemos querer e aceitar, ou, podemos não querer e não aceitar. Diretamente, esse Decreto é a ferramenta de luta – que agora temos – contra a opressão. Os $$ interessados $$ em nos pressionar e forçar a fazermos uso de LIBRAS e desconsiderar nosso meio de comunicação já construído, estão com os dias contados. O Decreto deve estar sempre a mão das Famílias e das Pessoas Surdocegas. Não seremos mais “marionetes” dos $$ interessados $$.

III – política educacional equitativa – conjunto de medidas planejadas e implementadas com vistas a orientar as práticas necessárias e diferenciadas para que todos tenham oportunidades iguais e alcancem os seus melhores resultados, de modo a valorizar ao máximo cada potencialidade, e eliminar ou minimizar as barreiras que possam obstruir a participação plena e efetiva do educando na sociedade;

Atenção onde diz: …medidas planejadas e implementadas com vistas a orientar as práticas necessárias e diferenciadas para que todos tenham oportunidades iguais…
Fundamental para Pessoas Surdocegas, sejam Pré Simbólicas ou Pós Simbólicas. O disposto acima veem ao encontro da Surdocegueira como Condição Única, com peculiaridades específicas e individuais.

IV – política educacional inclusiva – conjunto de medidas planejadas e implementadas com vistas a orientar as práticas necessárias para desenvolver, facilitar o desenvolvimento, supervisionar a efetividade e reorientar, sempre que necessário, as estratégias, os procedimentos, as ações, os recursos e os serviços que promovem a inclusão social, intelectual, profissional, política e os demais aspectos da vida humana, da cidadania e da cultura, o que envolve não apenas as demandas do educando, mas, igualmente, suas potencialidades, suas habilidades e seus talentos, e resulta em benefício para a sociedade como um todo;

Atenção onde diz: …orientar …efetividade …reorientar…
Três ações fundamentais e cotidianas na Educação e Desenvolvimento de Pessoas Surdocegas, sejam, Pré ou Pós Simbólicas. Como sabem sou direto… Isso nem precisaria estar num Decreto, pois, todo Educador que pretende atuar com Pessoas Surdocegas deveria ter estes fatores muito bem claros… Mas, como sempre digo, no Brasil tudo pode acontecer. Estes fatores, sim, eu observei no decorrer de minha caminhada, porém, eles não foram direcionados as Pessoas Surdocegas… Foram direcionados as pessoas “Ditas Normais”, por isso, existem muitas e muitas pessoas com mestrado e doutorado na área, enquanto as próprias Pessoas Surdocegas seguiram no fundo do poço. Bem, agora, Famílias e Pessoas Surdocegas, vamos à luta com o Decreto.

V – política de educação com aprendizado ao longo da vida – conjunto de medidas planejadas e implementadas para garantir oportunidades de desenvolvimento e aprendizado ao longo da existência do educando, com a percepção de que a educação não acontece apenas no âmbito escolar, e de que o aprendizado pode ocorrer em outros momentos e contextos, formais ou informais, planejados ou casuais, em um processo ininterrupto;

Atenção onde diz: Todo o “ V “ é fundamental.
Alô Mães, que lutaram e lutam… Alô Famílias! O Decreto – neste item ” V ” – nos faculta dias melhores. Vamos a Luta. Vamos buscar, exigir isso para que seus filhos possam ter uma oportunidade – e não ficarem abandonados a sorte!

Algo me pareceu um pouco desajustado:

Sou uma pessoa extremamente metódica, em outras palavras, sou chato pra Chuchu! Observando o “ VIII “ do Decreto, ficou claro para mim que busca-se pontuar a “Múltipla Deficiência”, a “Multideficiência”, sim, ótimo! Porém, seria bom ajustar mais, deixar mais evidente as palavras. Esse desajuste me preocupa! Enfim, vamos ler o “ VIII ” e logo escrevo dois argumentos:

VIII – escolas bilíngues de surdos – instituições de ensino da rede regular nas quais a comunicação, a instrução, a interação e o ensino são realizados em Libras como primeira língua e em língua portuguesa na modalidade escrita como segunda língua, destinadas a educandos surdos, que optam pelo uso da Libras, com deficiência auditiva, surdocegos, surdos com outras deficiências associadas e surdos com altas habilidades ou superdotação;

Atenção onde diz: … surdos com outras deficiências associadas e surdos com altas habilidades ou superdotação… Sim está correto. Não observei desajuste aqui… O desajuste está em não considerar (Escrever com clareza) também isso para os cegos e surdocegos. Foi destacado “surdos com outras deficiências”. Também poderiam deixar evidente “cegos com outras deficiências’. Existem no Brasil milhares de Cegos com outras condições! E o que mais me preocupou? Deveria estar muito, mas muito claro e evidente “surdocegos com outras deficiências”. A Surdocegueira apresenta a multiplicação de condições como uma característica básica, e, está, fortemente relacionada a anomalias genéticas, a síndromes e doenças raras, isso significa que as Pessoas Surdocegas apresentam outras condições com frequência. Na minha trajetória como Pessoa Surdocega e Educador observei que, de cada 10 Surdocegos Pré Simbólicos, 7 apresentavam outras condições associadas. E, de cada 10 Surdocegos Pós Simbólicos, 4 apresentavam outras condições associadas. Eu mesmo fui e sou uma Pessoa Surdocega com outras condições associadas. Creio muito claro. O “ VIII ” está desajustado neste sentido. Enfim, seria simples fazer este ajuste! Tá dada a dica, tá feito o alerta!

Atenção onde diz: … surdos com altas habilidades ou superdotação… Aqui, minha argumentação é semelhante – ou quase – a anterior. Se a Política Nacional de Educação Especial pretende ser Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida, deve sim, apontar claramente que existem “cegos com altas habilidades ou superdotação” e que, sim, existem “surdocegos com altas habilidades ou superdotação”. Se o item “ VIII “ apontar apenas os surdos nestes quesitos, fielmente observo um desajuste grave. Tá dada a dica, tá feito o alerta!

Bem, no início disse que seria breve e, escrevi de montão! Disse também que iria destacar pontos muito específicos, sim, feito, e logo abaixo está o link onde podem acessar o Decreto por completo!

https://www.in.gov.br/…/decreto-n-10.502-de-30-de…

“Minha fórmula de vida e busca por desenvolvimento foi exitosa: superar as barreiras que minha condição de pessoa surdocega, com hidrocefalia e doença rara, a partir do fortalecimento das capacidades pessoais-individuais”.

O Decreto está longe de ser perfeito, sim, porém, me passa a forte impressão que busco promover o que descrevi na “Minha Fórmula” ou seja, quanto mais individual for o processo Educativo das Pessoa com Deficiência, mais efetivo este processo será para que a inclusão tome forma e movimento sustentável.

Eu sigo aqui e vocês ai… Cada qual com suas particularidades e todos em busca da efetiva Inclusão!

Saudações e, por favor, compartilhem esta publicação!

Alex Garcia é fundador e presidente da AGAPASM – Associação Gaúcha de Pais e Amigos dos Surdocego e Multideficientes – www.agapasm.com.br

Perfil: http://www.agapasm.com.br/alexgarcia.asp

_________________________________________

Fonte: https://revistareacao.com.br/breve-analise-da-politica-nacional-de-educacao-especial-equitativa-inclusiva-e-com-aprendizado-ao-longo-da-vida/

Destruir por Decreto - Bolsonaro promove ruptura em política de inclusão de alunos com deficiência

Destruir por Decreto (7.out.2020 às 23h15)


O governo de Jair Bolsonaro se especializa em usar a regulamentação infralegal na tentativa de dar fim às políticas públicas de que não gosta. É a destruição por decreto.

Assim a administração procurou sabotar a legislação para o controle de armas, reverter a redução de danos no tratamento de quimiodependentes e desfazer boa parte das proteções ambientais.

A onda também chegou à educação. O governo editou decreto que estabelece uma nova Política Nacional de Educação Especial, revoltando militantes e especialistas.

Eles entendem que a nova norma, ao abrir espaço para a volta das escolas especiais, poderá enfraquecer décadas de esforços para promover a educação inclusiva de portadores de deficiências.

Mais ou menos até o início dos anos 1990, a situação educacional desses jovens e crianças era desastrosa. Eles eram frequentemente excluídos das classes regulares e despachados para salas ou mesmo unidades especiais, onde recebiam pouca atenção pedagógica —além de serem privados do convívio com colegas sem deficiência.

A partir da Constituição de 1988 e de outras peças legais, bem como da assinatura de uma série de tratados internacionais e do esforço de pais e educadores dedicados, a situação começou a mudar.

Cada vez mais crianças com necessidades especiais  (o certo é educacionais) passaram a estudar em salas regulares, com bons resultados não apenas para esse grupo como também para os demais alunos, que recebem diariamente lições práticas sobre diversidade e tolerância.

A experiência pode ser descrita como um sucesso. Como escreveu na Folha o colunista Alexandre Schneider, há 20 anos contavam-se 382 mil estudantes com alguma deficiência matriculados —dos quais cerca de 300 mil em classes especiais e instituições especializadas e pouco mais de 81 mil em estabelecimentos regulares.

Em 2017, já eram cerca de 900 mil matriculados em classes regulares e 170 mil em classes exclusivas.

O modelo seguido pelo país, que também oferece a alternativa de atendimento especializado no contraturno, é conceitualmente correto e, como os números provam, factível. Não se vê razão para nenhuma mudança radical.

Aperfeiçoamentos são sempre bem-vindos. Não haveria mal, em princípio, em dar maior possibilidade de escolha aos pais. Há aqueles, em geral lidando com quadros mais difíceis, que preferem manter seus filhos em instituições especializadas. O objetivo geral de incluir, indiscutível, pode admitir opções para casos particulares.

Entretanto o governo Bolsonaro erra mais uma vez ao promover a destruição por decreto, em vez de estudar, dialogar e negociar.

____________________________________________

Fonte: O que a Folha Pensa... Destruir por Decreto

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2020/10/destruir-por-decreto.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa