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Posição de Erenice Carvalho
O Decreto nº 10.502/202 que institui a Política Nacional de Educação Especial tem problemas que ainda precisam ser dirimidos. A produção de subsídios que basearam o texto inicial (2018) foi realizada com base em relatórios de consultores selecionados por edital da Unesco em seleção pública aberta em âmbito nacional com resultados publicizados, inclusive currículo e entrevista.
O processo de elaboração do texto fundamentou-se, portanto, em ampla avaliação nacional sobre os resultados da implementação da política de 2008, em vigor naquele momento. Os relatórios desse estudo nacional estão no MEC e na Unesco para consulta. Os consultores, grupo do qual participei, percorreram os estados e o DF, levantando numerosos dados mediante entrevistas, visitas (secretaria de educação, escolas e salas de recursos multifuncionais), conselhos estaduais de educação e ministério público estadual e do DF.
Mediante o uso de instrumento online, recebemos informações de todas as secretarias de educação dos estados, municípios e do DF. Enviamos questionário também ao ministério público dos estados. Levamos o ano de 2017 e 2018 em coleta e sistematização das informações buscadas.
Ao final de 2018, o texto da política estava pronto para consulta pública, divulgada nacionalmente para a população em geral, com respostas individuais enviadas ao MEC on line, tão logo finalizado o preenchimento. A Universidade Federal de Alagoas foi contratada para analisar os dados e enviou ao MEC um relatório da consulta ainda em 2018, com mais de 300 páginas (disponível no site do órgão), a tempo de finalizar a proposta de política antes da mudança de governo.
Reações de partidários da política de 2008 questionaram a inserção das escolas e classes especiais e das escolas e classes bilíngues no texto proposto. A despeito de sua existência na prática, legitimada na LDB, essas ofertas deveriam ser omitidas na política, alegando sua perspectiva inclusiva.
Durante todo o ano de 2019, o Conselho Nacional de Educação trabalhou com o MEC para atualizar o texto. Foram criados diversos grupos de trabalho para apoiar as discussões e a elaboração. Fiz parte de alguns desses grupos (def intelectual, múltipla, def visual e atendimento educacional especializado). Trabalhamos muito. Reuniões foram realizadas com pessoas e órgãos convidados para contribuir com subsídios, visando à elaboração de pareceres e resoluções para implementação da política, enquanto se aguardava seu lançamento. Antes disso, o material seria colocado também em consulta pública.
O Decreto que acaba de ser lançado foi formulado com base em dados produzidos, mas seu texto final não foi de nosso conhecimento. O texto contém conceitos e propostas, a nosso ver, carentes de revisão e alterações por parte dos interessados, dos envolvidos na elaboração das fontes e beneficiários da política.
AQUI SOU OBRIGADA A ESCLARECER QUE ESTE TEXTO DA PNEE NÃO "FOI FORMULADO COM BASE EM DADOS PRODUZIDOS NAS PESQUISAS". EU FIZ PARTE DO GRUPO DE CONSULTORES. MEU TRABALHO FOI SOBRE A BNCC E A EDUCAÇÃO ESPECIAL. POR ISSO PARTICIPEI DE TODAS AS REUNIÕES DOS GRUPOS DE CONSULTORES. E POSSO AFIRMAR QUE OS ESTUDOS REALIZADOS NÃO FORAM CONSIDERADOS NA CONSTRUÇÃO DO TEXTO DO DECRETO PUBLICADO.
Entendo que o momento é de reagirmos ao texto. Atitude democraticamente saudável... No entanto, defendemos que o Decreto não seja revogado, exumando a política de 2008. Porque conquistas importantes da sociedade estão contempladas nesse texto. No entanto, deve passar pela leitura crítica de todos e ser modificado. Este depoimento para vocês, amigos, e para seus outros amigos que nos leem, foi escrito porque parece meu dever, uma vez que participei do processo que antecedeu o texto do decreto, há quase 4 anos. Como alguns de vocês, atuei na educação especial e conhecemos os estudantes e suas famílias - DE FATO - e os colocamos no centro de nossas preocupações, reflexões e ações.
Somos acadêmicos também, além de experientes na área. Sinto-me afrontada ao ouvir ofensas equivocadas sobre escolas especiais, classes especiais, professores especializados. E de ver a comunidade escolar vista como antiguada, segregadora e conivente com o isolamento de pessoas em situação de deficiência. Trata-se de desqualificação, desrespeito e ignorância sobre o que se faz nos espaços especializados. É verdade que ainda existe muito a ser melhorado nesses serviços, mas não podem ser execrados e difamados do modo como está sendo feito.
Defendo a permanência do decreto, chamado pelos difamadores de “Decreto do Bolsonaro”. Nada mais impróprio. Também chamam a política de 2008 como “Política de Lula e Dilma”. Também impróprio. Porque eles não participaram da elaboração dos textos e nem constituem o público-alvo beneficiado pelos documentos a quem se destinam. A política é pública e pertence à sociedade. Não vamos entrar nessa politicagem... Ela desmerece nossa dedicação e esforço, além de vivência da cidadania.
O Decreto deve ser analisado, criticado e questionado, com vista aos ajustes necessários, conforme seus princípios e finalidades, por parte das famílias, estudiosos, pesquisadores, profissionais, legisladores, juristas, enfim, pela sociedade como um todo.
Mas exigimos respeito à categoria docente da educação especial, aos gestores e colaboradores que atuam nas escolas e classes especiais, aos estudantes e suas famílias, cujo protagonismo não pode ser questionado e desrespeitado. Ao contrário, deve ser acatado e fortalecido, para o bem-comum e para construção de uma sociedade igualitária, equitativa, responsável, tolerante e respeitosa.
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